domingo, 4 de novembro de 2012
Sob o poder libertador dos livros
(Jornal O Liberal de Belém-Pará)
Pesquisa do Instituto Pró-Livro-Retratos da Leitura no
Brasil -, divulgada recentemente indica que a zona rural do País concentra 66%
do total de não leitores, enquanto nas capitais esse percentual é de 22%. Mais
do que o preço dos livros e a ausência de bibliotecas públicas, o principal
fator para a carência de leitores, verificado pelo estudo, é a falta de
conhecimento do prazer da leitura. Para tentar dar um outro enredo a essa
história e, ao mesmo tempo, despertar o interesse e facilitar o acesso aos
livros, o projeto batizado de “Barca das Letras” está fazendo a diferença.
Criado em 2008, tem viajado pelo Brasil com a ajuda de voluntários rumo a
comunidades tradicionais - quilombolas, ribeirinhas, pescadores e indígenas -
com um único objetivo: apresentar o mundo da leitura às crianças e jovens.
A receita é simples: uma lona improvisada, semelhante à
usada em circos, fantoches, personagens da literatura infanto-juvenil e muitos,
muitos livros. O local escolhido para a apresentação pode ser um trapiche à
beira do rio, um barracão ou uma praça. O público - formado basicamente por
crianças e jovens - é convidado a participar através de um megafone, usado para
fazer o anúncio de que ali será aberto um espaço para a leitura. “Fazemos
sempre um contanto com as pessoas do lugar antes, para que elas possam convidar
todos a participar. Geralmente, eles também já organizam um espaço onde ficará
a biblioteca com todos os livros doados”, explica o voluntário e coordenador do
projeto no Pará, o escritor Cláudio Cardoso.
A ajuda do megafone imprimiu ao projeto, inclusive, um
subtítulo “Rádia – Nossa Casa de Cultura e Cidadania”. Nessas localidades o
rádio é um dos principais meio de comunicação e é chamado de rádia, daí esse
nome”, justifica. Já habituados à desconfiança inicial das crianças e jovens das
comunidades diante da ação, Cardoso conta que logo o receio dá lugar à
integração. “Levamos algo muito diferente do cotidiano daqueles lugares,
envolvendo o incentivo à leitura, fazemos um trabalho de contação de história,
de produção de texto e, aos poucos eles vão se integrando. Acabam fascinados
pelos livros, suas histórias e possibilidades”, garante.
Além de livros infanto-juvenil e didáticos, o projeto
distribui revistas, brinquedos e materiais escolares arrecadados em campanhas
realizadas de forma permanente em várias cidades brasileiras, inclusive em
Belém. Os moradores são orientados ainda para depois de ler trocarem com seus
vizinhos, fazendo um rodízio de livros.
“Barca das Letras” quer mudar realidade sem esperar por
governos Antes de ser concretizado, o projeto Barca das Letras nasceu e
amadureceu na cabeça de alguém que conhece a fundo a realidade das comunidades
afastadas dos grandes centros. Seu criador é o funcionário público federal
Jonas Banhos. Nascido na Comunidade Quilombola Conceição, no rio Macacoari, no
Estado do Amapá, ele precisou deixar o lugar de origem para consegui estudar.
Atualmente morando no Distrito Federal, há cerca de quatro anos, Banhos
resolveu retornar ao local onde nasceu e ajudar, não só a sua comunidade, mas
todas as outras pelo Brasil que ainda não descobriram o poder libertador dos
livros.
“Queremos mostrar que é possível fazer a diferença, mudar uma realidade, sem esperar por ajuda de governos, apenas fazendo a nossa parte. É essa a mensagem que queremos deixar nas comunidades por onde passamos”, resume o idealizador do projeto. O ponto de partida, segundo ele, é “alfabetizar no prazer da leitura”, resume. Sem ajuda oficial, Banhos tem contado apenas com os próprios recursos e com a ajuda de seus parceiros para percorrer comunidades e apresentar aos seus moradores o prazer da leitura. “Sei exatamente o poder dos livros, sei que é capaz de transformar realidades”, afirma. Em 2010, o projeto foi um dos vencedores do Prêmio Tuxaua, do Ministério da Cultura (MinC). Lançado há três anos, a iniciativa visa melhorar a articulação entre os Pontos de Cultura e demais representantes de iniciativas que promovam o fortalecimento de laços sociais, culturais e artísticos. “Estamos executando ainda a segunda etapa desse prêmio, mas minha ideia é poder chegar a, pelo menos, toda as regiões Norte e Nordeste do Brasil”, diz.
Parceiros:
Um dos colaboradores do projeto Barca das Letras, no Pará, é
o escritor Antônio Juraci Siqueira. Autor de mais de 80 títulos individuais
publicados entre folhetos de cordel, livros de poesias, contos, crônicas,
literatura infantil, histórias humorísticas e versos, além de poemas musicados
por compositores locais, Juraci conheceu o trabalho há cerca de três anos e
acredita ser uma iniciativa que vai além do incentivo à leitura. “Esse é um
projeto que não só leva literatura a criança e jovens de comunidades afastadas,
como contribui também para divulgar o trabalho de escritores. Isso é muito
importante, porque torna o trabalho uma via de mão dupla”, analisa Juraci, que
já fez doações de livros para o projeto.
Para o professor de Literatura Antônio Maria Caldas, o
alcance do projeto vai além do imaginado. “Enquanto educador sei ser possível
fazer uma criança ou um jovem ler um livro, mas nesse aspecto esse projeto
possui um diferencial inovador, uma vez que se propõe despertar o gosto pela
leitura nesse público. E isso é muito mais importante nos dias de hoje, quando
o livro concorre com a internet, com o videogame, com a televisão e tantas
outras coisas”, avalia.
Barca das Letras:
Projeto incentiva leitura em comunidades carentes visando
formar cidadãos “Não temos vínculos políticos. Contamos apenas com a boa
vontade dos voluntários.” muito mais enriquecedores”, esclarece o coordenador.
O primeiro passo para a execução do Barca das Letras é definir o local para a
ação. “Recebemos indicação e as próprias comunidades nos procuram”, diz.
Voluntários:
Como a arrecadação de material é permanente, a etapa
seguinte é ir em busca de parceiros dispostos a colaborar não só com essa
doação de material, mas também com a ajuda para a estadia, alimentação e
transporte para as localidades que são sempre bastante afastadas e materiais de
divulgação das ações como banners, camisas e faixas. “Não temos vínculos com
governos, partidos políticos ou coisas do tipo. Contamos apenas com a boa
vontade dos voluntários”, reforça. Normalmente cada ação conta com a
participação de cinco a dez parceiros, dependendo da disponibilidade de cada um
e da proximidade com o local onde a visita será realizada. “Como não temos
recursos, a participação das pessoas que nos ajudam é totalmente voluntária.
Elas são responsáveis por arcar com as suas próprias despesas para participar do projeto. E ao longo
desses anos todos, temos conseguido o apoio de várias profissionais, desde
professores, arte educadores, escritores, enfim pessoas realmente dispostas a
ajudar”, afirma.
Como parte do projeto, também está prevista a volta a esses
locais para avaliar os resultados do trabalho. “Procuramos sempre retornar a
essas comunidades e em todos os lugares temos obtidos um retorno positivo”,
afirma. O Barca das Letras já montou mais de 13 bibliotecas no Estado do Amapá
e comunidades do Distrito Federal, Piauí, Roraima, Goiás, entre outros. No
Pará, já esteve em municípios como Capitão Poço (Fazenda Santo Antônio – uma
área quilombola), Ourém, Santarém Novo, entre outros, e nos próximos dias 26 e
27 de maio, o projeto estará na Ilha de Maiandeua, no município de Maracanã,
onde fica a comunidade de pescadores conhecida como “Tio Milico”. “Eles já têm
uma biblioteca lá, vamos fazer apenas uma manutenção e o nosso trabalho de
incentivo à leitura”, explica Cardoso. Longe de ser apenas uma “doação” de
material, as “mochiladas”, como costumam ser chamadas as visitas às
comunidades, são compostas de um trabalho envolvendo arte educação no intuito
de despertar o prazer pela leitura. “Não fazemos caridade, queremos realmente
incentivar o gosto pelos livros e pela literatura através da arte-educação
voltada para formar cidadãos.
Em tempos de computador e internet, temos a convicção de
que, para as crianças e jovens desses locais, a penetração do livro pode dar
resultados seja em comunidades quilombolas, ribeirinhas, de pescadores ou
indígenas. Não importa. O espaço para a leitura se forma em qualquer lugar e os
arte-educadores rompem a barreira da desconfiança conquistando jovens e
crianças para o prazer de ler.
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